sexta-feira, 25 de setembro de 2009


“Vocês devem tomar mais cuidado não só com O QUE falam, mas também COMO falam. Às vezes, filho, uma palavra dita de certa forma dói mais que uma lambada no couro. Pra saber se vocês devem falar uma coisa, pensem primeiro em como vocês se sentiriam se alguém falasse aquilo lá pra vocês. Você já viu algum preto-velho resolver alguma coisa gritando? Pra quê gritar se você pode conversar e explicar melhor o que você quer?”
Pai Joaquim do Congo (Lula)

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

AS MISSÕES NA UMBANDA


“Porque muitos são chamados, mas poucos escolhidos”. Mateus 22:14

Dentro do ritual Banthu-Ameríndio, é no dia da obrigação de feitura da Cabeça – ou Mão de Santo – que sabemos qual a nossa missão na Umbanda. De Cambono Colofé, a Alabê, de Ganga a Babalorixá, é partir daí que sabemos o tamanho da cruz que deveremos carregar no que se refere a nossa vida espiritual. E quando me refiro ao “tamanho da cruz”, não estou querendo ser sarcástico ou fazer qualquer tipo de humor. A “cruz” de quem tem missão superior na Umbanda é pesada, pois as responsabilidades carmáticas são muitas.

Antes de qualquer coisa, “receber uma missão” dentro da Umbanda não deveria ser motivo de orgulho ou jubilio para ninguém. Se por um lado, a missão pode ser entendida como uma verdadeira convocação ou outorga divina para tarefas que exigem espíritos encarnados mais experientes ou com uma maturidade maior que os demais dentro de um determinado contexto, por outro lado, mostra claramente como é grande a necessidade do resgate cármico que esses mesmos espíritos têm. Falando mais claramente: Se você tem a capacidade para resolver e agir desta forma, se o seu espírito encarnado é capaz de tomar para si tamanha responsabilidade e mesmo assim você ainda está aqui com a necessidade fazer isso... é muito importante que você vigie bem os seus atos! Ou como diria certo irmão no santo: COM CERTEZA VOCÊ ESTÁ DEVENDO!

Vou tomar emprestado o exemplo de uma outra religião, para que o entendimento possa ser mais claro. A missão superior dentro da Umbanda, encontra parâmetros de comparação com o apostolado bíblico. Por essa razão, quem já leu a bíblia sabe que existiram muitos discípulos e poucos apóstolos. Aos apóstolos, eram conferidos ensinamentos mais amplos e minuciosos, que demonstravam idéias que aos discípulos só eram expressas através de imagens fortes ou parábolas. Por isso, creio que a convocação divina, a missão, deve ser explícita em quem a tem, não só pela autoridade conferida, ou pelo conhecimento adquirido, mas sobretudo pelo encargo moral e uma conduta condizente, refletidos em ações diárias e uma responsabilidade de quem se torna pressuposto penal necessário de punibilidade aos seus atos ou de quem o segue. Ou seja, consciente com relação aos atos que pratica ou leva outros a praticarem, sua responsabilidade cármica se torna ainda maior já que você não é mais responsável apenas por você, mas por outros também, tanto em atitudes como em modelo a ser seguido. Voltando ao exemplo bíblico, por isso nem todos os médiuns devem carregar essa “cruz” ou receber essa missão. Aliás, são poucos os que são chamados diretamente para uma missão específica, o que nos faz lembrar as palavras: “Muitos são chamados (médiuns), mas poucos os escolhidos (missão superior)”.

Então, você que recebeu ou receberá missão na Umbanda, antes de encher-se de orgulho, entenda a gravidade e a responsabilidade da qual você foi imbuído. Entenda que é através deste - com certeza - difícil caminho, mas - quem sabe - também recompensadora senda, é que você conseguirá resgatar dívidas pretéritas e posicionar-se um dia em um plano mais elevado, mas que hoje você ainda não está lá. Como diz aquele belo ponto de Linha das Almas: “Eu fui à Bahia, fui pedir ao Senhor do Bonfim, que Ele me ajudasse, a seguir na Umbanda meu caminho até o fim, Meu senhor do Bonfim, me ajude, Eu preciso de paz e saúde”. E claro, muito discernimento.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

A CRENÇA UNIVERSAL NA REENCARNAÇÃO (8): CONCLUSÃO


"Se um asiático me pedisse uma definição de Europa, eu seria forçado a responder-lhe: É aquela parte do mundo que é assombrada pela incrível ilusão de que o presente nascimento da pessoa é sua primeira entrada na vida…" Schopenhauer (Parerga e Paralipomena)

Chegamos aqui ao fim desta série de posts sobre a Crença Universal na Reencarnação e espero então poder voltar mais diretamente ao tema principal deste blog: Umbanda. Vale porém lembrar, que mesmo se tratando de um assunto comum a toda uma gama de religiões que aceitam e acreditam na reencarnação da alma humana, não nos distanciamos tanto assim do nosso objetivo primário. Embora a idéia inicial desta série fosse responder a um belo comentário de minha prima e irmã no santo, Cacau, a respeito de pessoas que professam outras religiões – ver o primeiro post desta série -, ao falarmos sobre o amplo conceito de reencarnação, transmigração, guigul, mentempsicose, renascimento, ou qualquer que seja o nome dado em qualquer cultura ou religião, falamos também a respeito de alguns dos conceitos mais básicos e fundamentais de nossa religião: REENCARNAÇÃO, CARMA, AÇÃO E REAÇÃO, MUNDO ESPIRITUAL, EVOLUÇÃO DA ALMA etc. Todos estes, comuns e apregoados nas mais diversas culturas, épocas e religiões, como pudemos ver durante esta nossa “viagem”.

É claro, que o objetivo desta série de posts não foi nunca ser um tratado completo e definitivo sobre o assunto. Ao contrário, foi só o de abrir os olhos para uma infinidade e diversidade de conceitos, crenças e mitos a respeito da reencarnação, expandindo horizontes e incentivando a curiosidade. Quem sabe até suscitar em você, leitor, a sede de pesquisa neste tão amplo tema? Há muito ainda que não citamos neste blog. Por exemplo, não falamos sobre os cátaros, uma doutrina intelectual cristã que acreditava em reencarnação e foi considerada herege, caçada e destruída pela Igreja Católica no século XIII. Muitos acreditam que eram eles os possuidores do Santo Graal. Embora o islamismo ortodoxo não aceite o conceito de reencarnação, espalhados por todo o oriente médio existiram confrarias sufistas onde sábios mestres dervixes ensinavam o contrário. Segundo alguns deles, o texto do Alcorão se divide entre o texto propriamente dito, zahir, e seu sentido oculto, batin, que somente uma freqüente meditação “iluminada” pode ajudar a desvendar. Existem também os Drusos, religião encontrada na Síria e Israel nos dias de hoje, professada também no Líbano e que acreditam na reencarnação como meio de purificação da alma até a perfeição divina. Ou os Alauítas, religião predominante na Síria que embora seja sincrética com elementos muçulmanos, cristãos, judeus e iranianos, acredita na reencarnação como meio de evolução da alma. Enfim, uma infinidade de culturas, crenças e mitos a serem explorados.

De qualquer forma, os primeiros passos foram dados. Cabe agora a você continuar esta jornada por conta própria. Continuaremos por aqui falando sobre a que este blog se propõe: UMBANDA, evolução espiritual e a busca por um caminho de luz. Esperamos que esta jornada tenha sido tão informativa e gratificante para você como foi para nós. Mas antes de terminar, vale citar o grande filósofo iluminista francês, Voltaire (1694-1778), maçom, ensaísta polêmico, defensor da liberdade imprensa, tolerância religiosa, imparcialidade criminal e uma das grandes mentes da história humana: “Afinal, não é mais surpreendente nascer duas vezes que nascer uma vez...”

Para quem quer saber mais:
Sociedades Secretas – Vol. I – Jean-François Signier e Renaud Thomazo
Parerga e Paralipomena – Arthur Schopenhauer
Religiões do Mundo - John Bowker

terça-feira, 15 de setembro de 2009

A CRENÇA UNIVERSAL NA REENCARNAÇÃO (7): JUDEUS


“Se alguém é mal sucedido no seu propósito neste mundo, o Eterno, Bendito seja, o desenraiza e planta mais e mais vezes“. (Zohar I 186b)

Ao descer do Monte Sinai, Moisés trouxe em suas mãos as tábuas sobre as quais Javé gravou os dez mandamentos que doravante deverão servir de Lei ao povo hebreu. Esse episódio fundamenta o caráter exotérico do judaísmo. Porém, os ensinamentos esotéricos são reservados para poucos estudiosos e as correntes se confundem. O fato de que a reencarnação seja parte da tradição judaica surpreende muita gente. Apesar disso, ela é mencionada em numerosas passagens em todos os textos clássicos do misticismo judaico, começando com a preeminente obra da Cabala, o Sefer há-Zohar (Livro do Esplendor).

Embora sejam muitos os que entendem que o conceito de reencarnação sempre esteve firmemente impresso na religião judaica, existem aqueles que não a aceitam de forma alguma. De um modo geral, com o nome de Transmigração de Almas (em hebraico Guilgul Neshamot), os praticantes do judaísmo, especialmente as correntes ortodoxas - como o hassidismo (aqueles judeus que andam de casacos e chapéus pretos) - e cabalistas acreditam que, após a morte, a alma reencarna numa nova forma física. Diversos textos clássicos atribuem grande importância à doutrina da Reencarnação, usada para explicar que os justos sofrem porque pecaram em uma vida anterior. Neles, o renascimento é comparado a uma vinha que deve ser replantada para que possa produzir boas uvas.

O Rabi Shamai Ende escreveu, na revista Chabad News de Dezembro de 1998: "O conceito de Guilgul (reencarnação) é originado no judaísmo, sendo que uma alma deve voltar várias vezes até cumprir todas as leis da Torah. Na verdade, cada alma tem dois tipos de missões nesse mundo. A primeira é a missão geral de cumprir todas as mitsvot da Torah. Além disso, cada alma tem uma missão específica. Caso não tenha cumprido a sua, a alma deve retornar a este mundo para preencher tal lacuna. Somente pessoas especiais sabem exatamente qual é sua missão de vida”.

Como vimos no post anterior, sobre religiões cristãs, diversas traduções da Bíblia, deturparam muitos dos seus significados no decorrer dos anos, de acordo com seus próprios interesses. Um exemplo claro está na seguinte passagem do Salmo 19:8, em Hebraico transliterado: "Torát Iavéh temimáh mshibat nefésh. 'edut Iavéh neemanoáh machkimat péti". A tradução mais fiel seria: "O ensinamento de Deus é perfeito, faz o espírito voltar. O testemunho de Deus é verdadeiro, transforma o simples em sábio". No entanto, a tradução feita pelas seguintes bíblias altera o sentido original da reencarnação: Bíblia Protestante da SBB (Sociedade Bíblica do Brasil): "A Lei do Senhor é perfeita, e refrigera a alma". Ou a Bíblia Mensagem de Deus (Edições Loyola): "A lei do Senhor é sem defeito, ela conforta a alma". Ou ainda a Bíblia de Jerusalém (Edições Paulinas): "A lei de Iahvéh é perfeita, faz a vida voltar". Ou seja, fica fácil entender porque os judeus não aceitam o Novo Testamento.


Para terminar, vamos às palavras do rabino Philip S. Berg: “A palavra hebraica para reencarnação é Guilgul Neshamot, que literalmente quer dizer “roda da alma”. É para esta vasta roda metafísica, com sua coroa constelada de almas, como estrelas nas bordas de uma galáxia, que devemos dirigir nosso olhar, se desejamos ver além da aparência da inocência punida e da maldade recompensada. Guillgul Neshamot é uma roda em constante movimento e, ao girar, as almas vêm e vão diversas vezes, num ciclo de nascimento, evolução, morte e novo nascimento. A mesma evolução ocorre com o corpo no decorrer de uma única vida”.

Para quem quer saber mais:
Analisando as traduções Bíblicas - Severino Celestino da Silva
Sociedades Secretas - Vol.I - Jean-François Signier e Renaud Thomazo
Chabad Brasil - Rabi Avraham Brandwein
Reencarnação – As rodas da alma - Rabino Philip S. Berg



A seguir: A CRENÇA UNIVERSAL NA REENCARNAÇÃO (8): CONCLUSÃO

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

A CRENÇA UNIVERSAL NA REENCARNAÇÃO (6): CRISTÃOS


'"Por que dizem, pois, os escribas que Elias deve vir primeiro?", ao que Jesus respondeu "Elias certamente há de vir, e restabelecerá todas as coisas. Digo-vos, porém, que Elias já veio, e não o reconheceram, antes fizeram dele o que quiseram". Então os discípulos compreenderam que lhes tinha falado de João Batista.'(Mateus, 17:10-13)

Segundo a maioria das pessoas sabe, a Igreja Católica, as Protestantes e os neo-Pentecostais costumam rejeitar a noção de reencarnação. O que a maioria das pessoas ignora, porém, é que historiadores isentos são quase unânimes em afirmar que os conceitos de reencarnação foram “apagados” dos textos cristãos no II Concílio de Constantinopla, em 553 d.C., sob influências do Imperador Justiniano, o que a Igreja Católica nega veementemente, alegando nunca ter tratado deste assunto e sim apenas condenado a pré-existência da alma.

Segundo fontes históricas, Justiniano era influenciado por sua esposa Teodora, filha de um guardador de ursos do anfiteatro de Bizância, que como ex-cortesã convertida ao catolicismo, tinha medo de ter que pagar em outra vida pelos pecados desta, influenciando assim seu marido que também passou a temer reencarnar como um homem comum ou pior: um escravo. Justiniano declarou verdadeira “guerra” aos ensinamentos do exegeta e teólogo Orígenes (185-235 d.C.) que reconhecia abertamente o conceito da reencarnação, e convocou o Concílio, de onde só participaram 164 bispos, sendo que 159 eram da Igreja Ortodoxa Oriental, diretamente influenciados por Justiniano, o que garantiu a ele os votos necessários para fazer o que ele quisesse. Vale salientar também que, embora estivesse em Constantinopla, sob a “proteção” do Imperador, não foi o Papa Virgílio quem convocou o Concílio, sendo a ele apenas submetidos alguns documentos para ratificação papal, o que acabou validando a reunião.

É praticamente um consenso entre pesquisadores e historiadores fora do ambiente católico, que os atuais textos da Bíblia foram tremendamente adulterados ao longo dos séculos, o que acaba gerando críticas e uma verdadeira “guerra santa” de erudição teológica. Ainda assim, espíritas citam diversos trechos das Sagradas Escrituras para validarem seus argumentos. Passagens como: Isaías, cap. XXVI, v.19: "Aqueles do vosso povo a quem a morte foi dada viverão de novo; aqueles que estavam mortos em meio a mim ressuscitarão". Ou ainda: Job, cap. XIV, v.10 a 14: "Quando o homem está morto, vive sempre; acabando os dias da minha existência terrestre, esperarei, porquanto a ela voltarei de novo". Tendo também clara referência à reencarnação em: S. Mateus, cap. XVI, v.13 a 17 - S. Marcos, cap. VIII, v. 27 a 30: "... porque uns diziam que João Baptista ressuscitara dentre os mortos; outros que aparecera Elias; e outros que um dos antigos profetas ressuscitara...". Entre diversos outros. É claro que os modernos teólogos católicos alegam que estas passagens são sempre citadas fora de contexto ou ainda sujeitas a diversas interpretações. Os teólogos protestantes e neo-pentecostais, religiões que surgiram muitos anos depois, costumam assumir também a visão herdada da Igreja Católica.


É fato, porém, que na antiguidade, diversos teólogos da Igreja levantavam também essa questão. Alguns acreditavam que passagens do Velho Testamento só poderiam ser explicadas à luz da crença na reencarnação. Em favor da teoria reencarnacionista, São Gregório, Bispo de Nissa, afirmou que "a alma precisa purificar-se e isso não acontecendo durante a vida na Terra, deve ser realizado em outras vidas futuras". Santo Agostinho, no seu livro Confissões, chegou a interpelar a si mesmo: "Não vivi em outro corpo antes de entrar no ventre de minha mãe”? São Clemente, de Alexandria, também era adepto fervoroso da teoria da reencarnação e isso pode ser facilmente encontrado em muitos de seus escritos. E para finalizar, Orígenes, que foi seu discípulo e herdou sua cadeira na escola catequética alexandrina, sábio cristão e mestre da Igreja até ser declarado herege por Justiniano, dizia: "Todas as almas chegam a este mundo fortalecidas pelas vitórias ou debilitadas pelas derrotas de uma vida pregressa. O seu lugar neste planeta é determinado por seus méritos ou deméritos do passado".


Para quem quer saber mais:
O Mistério do Eterno Retorno - Jean Prieur
Reencarnação, O Elo Perdido do Cristianismo - Elisabeth Clare Prophet
Bíblia Sagrada de acordo com a Vulgata Latina



A seguir: A CRENÇA UNIVERSAL NA REENCARNAÇÃO (7): JUDEUS

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

SETEMBRO: MÊS DOS IBEJIS


No CEUXCO (Centro Espírita de Umbanda Xangô Caô do Oriente), casa espírita do ritual Banthu-Ameríndio, onde professo minhas crenças e cultuo meus Orixás, temos como tradição comemorar em setembro os Ibejis. Orixás-crianças, ou gêmeos, ou encantados, são de grande importância nos trabalhos espirituais, tanto que, embora não possam ser Chefes de Cabeça, não é raro serem “coroados” 2° ou 3° Orixás na Cabeça de algum médium da casa. Outro dia mesmo, em uma quarta-feira de consulta onde prestamos caridade a quem nos procura, Pai Joaquim do Congo (Lula) me deu uma bela lição enfatizando a importância da ajuda destas entidades nos trabalhos dos pretos-velhos. Segundo ele, trabalhar com Ibejis era ótimo, já que eles se esforçam muito em ajudar, resolvem o que têm para resolver rápido e ainda voltam logo querendo fazer mais! Pensando nisso, resolvi prestar uma “homenagem”, publicando aqui esta bonita ITAN (Pra quem não sabe, um conto ou parábola, utilizada para transmitir conhecimentos na África ancestral) que, para mim, representa bem o poder e o jeito de "trabalhar-brincando" desta linha de Orixás:

“Os Ibejis, os orixás gêmeos, viviam para se divertir.
Não é por acaso que eram filhos de Oxum e Xangô.
Viviam tocando uns pequenos tambores mágicos, que ganharam de presente de sua mãe adotiva, Iemanjá.
Por onde passavam as pessoas falavam: “Olhem os Ibejis brincando”!
Nessa mesma época, a Morte colocou armadilhas em todos os caminhos e começou a comer os humanos que caíam em suas arapucas.
Homens, mulheres, velhos ou crianças, ninguém escapava da voracidade de Icu, a Morte.
Icu pegava todos antes do seu tempo de morrer haver chegado.
O terror se alastrou entre os humanos.
Sacerdotes, bruxos, adivinhos, curandeiros, todos se juntaram para pôr um fim à obsessão de Icu.
Mas todos foram vencidos.
Os humanos continuavam morrendo antes do seu tempo.

Os Ibejis, então, armaram um plano para deter Icu.
Um deles foi pela trilha perigosa onde Icu armara sua mortal armadilha.
O outro irmão seguia escondido, o acompanhado à distância por dentro do mato.
O Ibeji que ia pela trilha ia tocando seu pequeno tambor.
Tocava com tanto gosto e maestria que Icu, a Morte ficou maravilhada, não quis que ele morresse e o avisou da armadilha.
Icu se pôs a dançar inebriadamente, enfeitiçada pelo som do tambor do menino.
Quando o irmão cansou de tanto tocar, o outro, que estava escondido no mato, trocou de lugar com o irmão, sem que Icu nada percebesse.
E assim um irmão substituía o outro e a música jamais cessava.
E Icu dançava sem fazer sequer uma pausa.
Icu, ainda que estivesse muito cansada, não conseguia parar de dançar.
E o tambor continuava soando seu ritmo irresistível.
Icu já estava esgotada e pediu ao menino que parasse a música por uns instantes, para que ela pudesse descansar.
Icu implorava, queria descansar um pouco.
Icu já não agüentava mais dançar seu tétrico bailado.
Os Ibejis então propuseram um pacto.
A música pararia, mas a Morte teria que jurar que retiraria todas as armadilhas.
Icu não tinha escolha e rendeu-se.
Os gêmeos venceram.
Foi assim que os Ibejis salvaram os homens e ganharam fama de poderosos, porque nenhum outro orixá conseguiu ganhar aquela peleja com Icu, a Morte.

Os Ibejis são poderosos, mas o que eles gostam mesmo é de brincar.”



Essa itan, para bom entendedor, contém várias informações relacionadas aos Ibejis. Mas vale lembrar mais uma coisa que muitos podem não saber: Embora Icú, a Morte, não seja cultuado em nosso ritual, ele faz parte do panteão dos Orixás africanos. Segundo a crença yorubá, Icú é quem vem buscar as pessoas que morrem para levá-las de volta ao ventre de Nanã. É Nanã quem cria os seres do AIYÉ (Terra). Ela modela com a lama que tira da terra, mas quando Nanã cria uma pessoa, outra tem que morrer para preencher o buraco da terra. O buraco é o próprio ventre de Nanã, por isso ela precisa dos mortos que Icu vai buscar para enchê-lo de novo e o ciclo recomeçar...


Para quem quer saber mais:
Mitologia dos Orixás – Reginaldo Prandi
As Nações Kêtu – Origens, ritos e crenças – Agenor Miranda Rocha

quarta-feira, 2 de setembro de 2009


"Exú é uma entidade tão boa quanto qualquer outra! Ele trabalha com energias positivas também! Quem pode transformar essa energia em negativa é o médium com quem ele trabalha. É como a física e a matemática ensinam: Positivo(Exú) com negativo(Médium) é igual a negativo(Energia). Assim como positivo(Exú) com positivo(Médium) é igual a positivo(Energia). Então tudo vai depender do médium..."
Pai João Cambinda (Delmo)

terça-feira, 1 de setembro de 2009

A CRENÇA UNIVERSAL NA REENCARNAÇÃO (5): ÍNDIA


"Nunca houve um tempo em que Eu não existisse, nem você, nem todos esses reis; e no futuro nenhum de nós deixará de existir. Assim como, a alma encarnada passa seguidamente, neste corpo, da infância à juventude e à velhice, similarmente, a alma passa para um outro corpo após a morte. Uma pessoa sóbria não se confunde com tal mudança". - Bhagavad-gita (2: 12-13)


Arqueologicamente, os registros históricos sobre a reencarnação na Índia são tão antigos quanto os do Egito, mas popularmente a identificação foi ainda maior já que foi nessa cultura que o conceito encontrou seu grande desenvolvimento, fazendo parte das crenças dos seus habitantes até hoje. Segundo a maioria dos pesquisadores, o surgimento da doutrina na Índia é por volta de 1.500 a.C., com a publicação dos Vedas, uma obra poética composta por 1.200 hinos dedicados aos deuses e uma série de práticas religiosas.


Em toda parte é possível encontrar relatos de pesquisadores não ligados à chamada “arqueologia oficial”, que afirmam datas muito mais recuadas para a civilização da região, propondo assim que as noções de reencarnação já estariam estabelecidas na Índia em uma época muito anterior ao surgimento da civilização egípcia. Segundo estas fontes, os árias – ou arianos – teriam chegado à região posteriormente, somente assimilando os antigos conhecimentos. Estes estudiosos garantem que é de fato na Índia que nasceu a verdadeira compreensão da reencarnação, falando em um processo infinito de morte e renascimento como uma forma de levar a humanidade a compreender a iluminação e buscar a libertação da alma.


Assim, antes da religião hindu se ramificar em inúmeras crenças e cultos, ela possuiria um credo único, segundo o qual todas as formas da natureza eram manifestações da Vida Una, com exceção da alma, vista como um elemento diferenciado desta unidade. Sua “missão” era modificar-se, crescendo e aprendendo através de sucessivas encarnações, até poder retornar à sua origem, ao ponto de onde surgiu, atingindo assim a libertação. Segundo uma das crenças hindus, moksha (libertação) é o quarto e derradeiro objetivo na samsara (ciclo de renascimento) em mundos inferiores. Quem alcança a moksha, já ultrapassou a ignorância e percorreu o marga (caminho). O marga é composto de três percursos principais: Jnana (caminho do conhecimento ou compreensão), Bhakti (caminho da devoção) e Karma (caminho da ação). Pode-se conseguir a iluminação através de qualquer uma dessas vias, cada espírito está livre para escolher a que parece mais apropriada para a atual encarnação. O certo é que a moksha não pode ser um objetivo em si, na verdade ela só poderá ser alcançada quando todo o desejo e o apego forem abandonados, incluindo o desejo pela própria moksha. Não existe nenhum salvador ou redentor, mas muitas seitas, guias, gurus ou deuses que podem te auxiliar durante o caminho.


Vale lembrar que a doutrina na Índia apresenta uma diferença com relação à moderna Doutrina Espírita levantada por Kardec e aceita como base pela maioria dos pensadores atuais: Ela entendia que era possível uma pessoa retornar para uma nova vida no corpo de um animal. Perante o espiritismo moderno, dentro da lógica que conhecemos, a alma não pode regredir. Pode estacionar, mas a evolução do espírito não admite retrocesso. Assim sendo, na nossa Umbanda admite-se a reencarnação como o processo das existências sucessivas, retomando o espírito o corpo físico, mas do mesmo ponto evolutivo em que se encontra para um novo aprendizado ou para restabelecer o equilíbrio perdido em vidas pretéritas.


Para quem quer saber mais:
Religiões do Mundo – John Bowker
Bhagavad-gita Como Ele É - A. C. Bhaktivedanta Swami Prabhupada
Índia Antiga Didática - André Bueno
Os Vedas – Raul Xavier


A seguir: A CRENÇA UNIVERSAL NA REENCARNAÇÃO (6): CRISTÃOS